Roberto Macedo (*)
Continuo a minha habitual pregação de que o Brasil precisa enfrentar o baixo crescimento econômico, caminho pelo qual enveredou desde a década de 1980. Lembro novamente que a partir de então a taxa de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) despencou para um valor médio de 2,4% ao ano. Na década anterior, a de 1970, essa taxa havia sido de 8,8% (!), próxima de taxas da China no período em que esta crescia fortemente, o que deixou de acontecer no período recente.
Aqui, desde 1980, salvo curtos períodos excepcionais, o PIB está em estagnação, que meu dicionário define como um período de crescimento abaixo do potencial. Recentemente, surgiu outro grave impacto dessa estagnação. A Folha de S.Paulo do dia 4/9 veio com a matéria Mais escolarizados caem na informalidade e veem renda desabar. Isso decorre da fragilidade do crescimento em sua demanda de mão de obra.
Mas o Brasil ainda não acordou para a imperiosa necessidade de fazer crescer mais rapidamente o PIB. Em particular, o Executivo federal não tem uma estratégia bem definida para isso e procurou contornar essa necessidade com mais uma edição do pequeno Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que, como as versões anteriores, também deverá enfrentar problemas de execução. E, no Congresso, os parlamentares que se preocupam com o frágil crescimento são escassa minoria. A preocupação predominante é a de obter posições no governo para companheiros e emendas parlamentares para suas bases eleitorais em busca de votos para eventual reeleição. Também insisto em que, com uma boa arrumada, nossa economia poderia crescer bem mais do que nesse passado de quatro décadas.
Para crescer mais, uma questão fundamental é o aumento da taxa de investimentos em formação de capital, ampliando atividades produtivas existentes e/ou gerando novas. Dados recentes apontam que essa taxa caiu de 18,3% do PIB, no segundo trimestre de 2022, para 17,2%, no mesmo período de 2023, e está muito longe de taxas mais próximas de 25% do PIB, que seriam necessárias para manter uma expansão sustentável do PIB a taxas satisfatórias.
Também venho insistindo em que, nesse contexto, uma questão fundamental é os investimentos do setor público terem caído fortemente no período 1980-2022. Repetindo considerações anteriores sobre o assunto, lembro que um gráfico do investimento público como proporção do PIB preparado pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas, cobrindo o período 1947-2022, mostra linha com formato próximo de um V invertido, pois começa com tendência em que passa de 2,98% do PIB em 1947 para 10,58% (!) em 1978, de onde veio caindo, com pequenas interrupções, para valores próximos de apenas 2,4% nos últimos seis anos.
Tenho procurado dados mais detalhados sobre essa sensível queda dos investimentos públicos e, na semana passada, deparei-me com um estudo voltado para a queda ocorrida no caso dos municípios, objeto de reportagem do jornal Valor Econômico no dia 15/9/2023. O subtítulo dessa reportagem assinala que “(…) despesas das prefeituras com infraestrutura e serviços caíram de 27,41% para 9,89% entre 1972 e 2022”. Acrescento que infraestrutura é tipicamente o caso de investimentos.
Já o título da matéria aponta a principal razão para essa queda: Em 50 anos, educação e saúde concentram gastos de municípios. E o texto da reportagem esclarece: “Se em 1972 a saúde respondia por 5,67% das despesas municipais, cinco décadas depois este porcentual estava em 25,49%. No caso dos gastos com educação e cultura, a participação quase dobrou. Subiu de 14,82% para 26,7%”.
Um dos especialistas ouvidos pelo jornal esclareceu que “(…) com a Constituição de 1988 (…) aumentaram muito as atribuições das prefeituras, mas os recursos não. (…) A concentração dos recursos na mão do governo federal é brutal”. A reportagem informa que a Constituição de 1988 “(…) determinou desembolso mínimo de 25% da receita de impostos e das transferências constitucionais para a educação. No caso da saúde, a determinação de no mínimo 15% (…) foi estabelecida pela Emenda à Constituição n.º 29/2000”. Outro entrevistado esclareceu que “essa obrigação engessa de certa forma o orçamento municipal e limita o gasto discricionário, no qual está incluído o investimento”.
Segundo outro especialista entrevistado, “(…) as prefeituras se viram incapazes de atender a demanda por outros serviços gerados por uma ‘urbanização explosiva’ do País. Entre 1940 e 2010 a população urbana (…) cresceu 15 vezes, enquanto o total de habitantes do País quadruplicou. (…) Não basta dizer que o município precisa investir tantos por cento em saúde. (…) Se não tem água potável, coleta de esgoto, (…) o poder público vai precisar gastar mais em remédios, consultas”.
Nada contra ampliar gastos em educação e saúde na esfera municipal. Mas Brasília determinou limites mínimos sem a adequada provisão de recursos, com o que outras necessidades foram prejudicadas. •
Esses investimentos foram prejudicados pela imposição constitucional de limites mínimos para despesas com saúde e educação, mas sem provisão de recursos adicionais
- Economista, é consultor econômico de ensino superior.
- O Estado de S. Paulo